quinta-feira, 9 de outubro de 2008

PROTEGER O PATRIMONIO CULTURAL, PORQUÊ?



POR JOÃO CASTELA CRAVO



Desde os anos 60 do século XX que, no âmbito da 3.ª' geração dos Direitos do Homem, se faz refe­rência, entre outros, ao direito ao património co­mum da Humanidade e ao direito ao desenvolvi­mento. É também comummente aceite que estes direitos devem ser articulados através do princí­pio de responsabilização das gerações actuais pe­rante as gerações vindouras e, no, fim, perante toda a Huma­nidade. Daí se chega ao conceito de desenvolvimento susten­tável, que deve sempre ter em conta a qualidade de vida das gerações presentes e futuras. Um equilíbrio complexo, que exige soluções também elas complexas, que põem em causa, inclusive, as questões da soberania dos Estados-Nação. O mundo e os seus recursos têm que ser entendidos como nni­tos, pelo que ao desenvolvimento tem que se apensar, sem­pre, conceitos, como o do equilíbrio e da racionalização.
Normalmente estes conceitos são referenciados em ter­mos de recursos naturais e encadeando-se em sistemas polí­ticos, económicos, sociais e tecnológicos. Contudo, todo o desenvolvimento humano é assente em referentes cultu­rais. O Romo Faber é um homem produtor de cultura, que depois a organiza numa memória reOexiva, condição funda­mental da possibilidade de pensamento.
Para além da sua memória orgânica, o Homem possui ain­da uma memória artificial, colectiva, armazém onde organiza a actividade do seu intelecto, ao longo dos tempos. É a essa memória colectiva que nós chamamos Património Histórico. Como valor de memória, esse Património é testemunho, seja
qual a forma que assuma. Aqui entra o termo Monumento, do latim monere, advertir, instruir. Património é, então, tudo o que é documento de História do Homem, sendo que a sua im­portância se traduz em conhecimento histórico e, especial­mente, em valor de construção do real.
uma perspectiva ontológica, o Homem constrói o seu real, um mundo afável, porque seu conhecido. Pelo inverso, tudo o que está para lá desse mundo ôntico faz-lhe medo. Se não conhece os fenômenos o Homem-ser não os domina, não os pode natural'. Atentemos numa pequena história, naturalmente ficcionada - "O Pedra, um jovem de 19 anos, tem um acidente de mata. Transportado para o hospital, descobre-se que devido ao impacto, ficou amnésico. Não reconhece os pais, não sabe quem é. Sem outros problemas físicos, foi levado para casa. Não reconheceu aquele espaço, o seu quarto nada lhe diz, não sabe quem são os seus irmãos, os seus amigos, mostram-lhe os seus livros, en's, mas para ele nada significam!" - Será O Pedra feliz, no seu registo patológico? Claro que não!
O equilíbrio psíquico do ser humano exige balizas que assinalam o seu real construído. Ao não existirem essas ba­lizas ou ao não as compreendermos, corremos o risco de um completo desenraizamento. E esta asserção é válida, tanto para o indivíduo como para a comunidade. Uma comuni­dade que perca a sua memória torna-se infeliz e hipoteca as suas possibilidades de desenvolvimento, uma vez que deixa­rá de pensar no futuro. Sem o passado, a capacidade de pen­sar o tempo deixa de existir.
Mas afinal o que é o Património? Pegando no que atrás foi dito, ele é tudo o que é documento, são todas as fontes da História, desde os grandes imóveis de valor arquitectónico indiscutível, até aos ambientes, por vezes modestos, rurais e urbanos, passando por um património etnográfico, artístico, arquivístico, etc. Cada uma das peças que integram estes con­juntos são únicas, em especial se as considerarmos de uma forma local. São sinais de um tempo que urge decifrar, valori­zar, racionalizar e proteger. Não apenas por deleite intelec­tualista, mas porque eles são recursos únicos e finitos numa perspectiva de desenvolvimento. Como Homens hodiernos, temos o direito de aceder a esse Património. Mas esse direito é onerado do dever de legatários para com as gerações do futuro.
A talhe de foice, e o que é que se passa com o nosso conce­lho? O concelho da Amadora não é, à primeira vista, um con­celho muito rico em Património Histórico. Melhor dizendo, não abundam peças de grande escala e valor absoluto. Mas é óbvio que no concelho existem muitos vestígios históricos, que acabam por constituir um conjunto patrimonial cheio de dignidade, que nos leva a reclamar os direitos e nos onera os deveres acima mencionados. Sem querer inventariar, elenco aqui alguns, porventura dos mais importantes ao nível do Pa­trimónio Arquitectónico. Começando com os imóveis classifi­cados como Monumentos Nacionais, é de referir o Aqueduto das Águas Livres (classificado por Dec. de 23 de Junho de 1910), cujas principais nascentes, uma significativa parte do seu percurso e ainda diversos ramais subsidiários se situam na Amadora. Outro Monumento Nacional é o conjunto fonnado pelas três Grutas Artificiais do Tojal de Vila Chã, em Caren­que (Dec. de 20 de Janeiro de 1936), túmulos colectivos per­tencentes à época do neolítico/calcolítico, formando com os exemplares da AJapraia (Cascais) e da Quinta do Anjo (Palme­la) um conjunto único no Mundo. Para além destes dois Monu­mentos acionais, temos ainda um outro Monumento classifi­cado, o Aqueduto da Gargantada, neste caso Imóvel de Inte­resse Público desde 12 de Setembro de 1978, ligado ao Palácio de Queluz. Estão ainda em estudo para classificação, outras peças, mormente a Quinta das Ton'es, na Buraca e a dos Con­des da Lousã, na Damaia de que foi proprietário O conhecido Padre Himalaia. Ambas fazem partejá do Inventário do Patri­mónio Arquitectónico. Mas para além destes, outros imóveis ou conjuntos têm dignidade suficiente, para além de valor histórico, para os podermos considerar como peças insubsti­tuíveis do nosso Património. À guisa de lembrete, O Aqueduto Romano, a Ponte Velha de Queluz, exemplar único seiscen­tista, a Casa da Ordem do Hospital, o edificio da antiga Quinta da Brandoa, O conjunto pertencente à Casa do Infantado (em frente ao quartel dos Bombeiros), a Quinta do Assentista, a de S. Miguel, o conjunto rural de A-da-Beja, a Capela da Fala­gueira, o Chafariz da Porca1hota, o celeiro de quinta, junto ao Parque Delfim Guimarães, as casas Aprígio Gomes e Roque Gameiro, integradas na arquitectura ecléctica de transição do século XIX para o XX, o conjunto/frente urbana art deco da rua l.Q de Dezembro e Mestre Roque Gameiro, a mina de água que deu o nome ao Bairro da Mina, o edificio dos Recreios, enftm, muitos outros aqui poderíamos referir, mas não será esse o assunto principal deste artigo. O que é importante é per­ceber·se a enorme capacidade que este conjunto patrimonial
tem, na Amadora, para ser utilizado como recurso histórico· -cultural. De recordar, que na Amadora havia muitos outros edificios que entretanto foram destruídos.
Obviamente que nesta tarefa de proteger e legar o Patri­mónio, não nos podemos esquecer da nossa condição de, tam­bém, produtores de Património. O Homem como animal gre­gário, vive em grupos, grupos que se inserem em espaços, ur­banos e rurais, que não podem parar no tempo. Não se advoga aqui o imobilismo. Se um espaço não cresce, não se modifica, ele morre! E aí, a vida humana também está morta! Proteger sim, mas através do bom senso, inserindo o Património no pró­prio pulsar do viver. Para além dos valores histórico, artístico, cultural, etc., outros valores estão presentes no Património, sendo que o económico e o turístico, por exemplo, não são os menos importantes. Ê, então necessária uma atitude patrimo­nial que englobe todos estes sentidos, pois todos eles se entre­tecem no desenvolvimento humano. A protecção não deverá
implicar um acto de isolamento, mas sim um acto de comu­nhão. Claro que devemos ter sempre em conta a dignidade do monumento-documento, a sua qualidade e capacidade de gerar memória. Mas deve-se ter sempre em conta que proteger é reabilitar! A reabilitação será o caminho mais óbvio para uma boa política de Património. Os beneficiários serão, não uma entidade abstracta, mas sim os homens e as mulheres de hoje e de amanhã. Mas não se pode, neste sentido de produto­res de Património, esquecer a vertente do novo Património. Proteger não só o que é antigo, mas também defender e pro­mover a produção contínua de peças de valor, essa será uma componente lógica de uma verdadeira atitude patrimonial.
E a quem cabe esta tarefa? A todos! Instituições inter­nacionais, Estado, Autarquias, populações! No caso português, o artº 78 da Constituição de 1976 diz que: "O Estado tem obri­gação de preservar,; defender e valorizar o património cultural do povo português". Mas, para além da obrigação do Estado, necessário se torna, a construção de uma consciência social do valor do Património. Por mais dinheiro que se gaste, seja pelo poder central, seja pelo local, se a população não sentir corno seu, esse Património, ele nada valerá. Assim, não será dema­siado utópico considerarmos como primeira linha de defesa e protecção do Património Histórico-Cultural, os bancos das es­colas, sendo que os alunos deverão ser os principais veículos de consciencialização desta problemática. Aos professores e de­mais agentes do ensino cabe, pois, urna boa parte desta tarefa. E não é a Escola, uma das mais importantes peças do nosso Património? Não é aí que se devem dar algumas das mais im­portantes transferências de memória?
In AmadoraEduca, nº 12, Maio, 2005

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Cadeira de Património Cultural e Urbano

Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias
Licenciatura em Turismo


Disciplina:

Património Cultural e Urbano

ECTS: 4

Duração: Semestral
Ano Curricular: 2.º


Carga Lectiva Semanal: 2






Âmbito da disciplina:

Pretende-se familiarizar os estudantes com os conceitos e a problemática do Património Cultural e a sua relação com o espaço urbano, espaço esse, privilegiado do turismo cultural, mormente do património como produto turístico.



Competências adquiridas com a disciplina:


· Articulação dos conceitos de Cultura, História e Património;
· Percepção da importância do espaço urbano como espaço patrimonial e da sua turistização;
· Reconhecimento da importância do Turismo como forma de reabilitação do Património Cultural e dos Centros históricos urbanos como produtos turísticos.






Programa:

Definições e Conceitos
1.1.Cultura
1.2.História e Património
1.3.Património: Conteúdos Eruditos e Populares
1.3.1. Património material ou tangível
1.3.2. Património imaterial ou intangível
Teorias e políticas do Património
2.1.A Conservação
2.2.A Reabilitação
2.3.As normas e recomendações internacionais
2.4.A legislação nacional
O contexto urbano como veículo privilegiado do Património Cultural
3.1.Cidade e Centros Históricos
3.2.A Cidade como produto turístico cultural
Uma aproximação à História da Cidade Portuguesa e à problemática dos seus Centros Históricos.
Património e fruição cultural – o Turismo como estratégia de sustentabilidade do Património
5.1.A turistização como reconhecimento do valor do Património
5.2.O Turismo como meio e justificação da reabilitação e revitalização do Património



Bibliografia

. Fundamental


a.a.v.v.,
2006, Arquitectura y Turismo, D. Medina Lasansky & Brian Mclaren (edts), Barcelona, Editorial Gustavo Gili
BOUD-BOVY,
M. & F. LAWSON, 1998, Tourism and Recreation, London, Ed. Architectural Press
CUNHA,
L., 2003, Perspectivas e Tendências do Turismo, Lisboa, Edições Lusófonas
HENRIQUES,
Cláudia, 2003, Turismo, Cidade e Cultura, Lisboa, Edições Sílabo
LOPES,
Flávio & Miguel Brito CORREIA, 2004, Património Arquitectónico e Arqueológico, Lisboa, Livros Horizonte
OMT
e ONU, 1995, Carta do Turismo Sustentável – Declaração de Lanzarote, Madrid
SALGUEIRO,
Teresa Barata, 1992, A Cidade em Portugal, Porto, Edições Afrontamento
SILVA,
Jorge Henrique Pais da, s.d., Pretérito Presente, Lisboa, Comissão organizadora da Campanha nacional para a Defesa do Património


. Complementar

a.a.v.v.,
1993, Património Arquitectónico e Arqueológico Classificado, Lisboa, IPPAR
a.a.v.v.,
1988, (1976) Tesouros Artísticos de Portugal, Lisboa, Selecções do Reader’s Digest





Normas de Avaliação:

Um teste com ponderação de 25%
Um trabalho com ponderação de 25%
Avaliação contínua que inclui pequenos trabalhos solicitados ou voluntários com ponderação de 50%